segunda-feira, 29 de outubro de 2012

DO MESMO MAL

Se és pecado e segredo,
se és um sonho de outono,
se és esperança e medo,
se és perguntas e não respostas,
se és um jogo,uma aposta,
de quem tu gostas?
Vives em mim,nada te devo,
me enches o dia,me roubas a noite,
meu lado oculto,um doce vício,
és sacrifício? O meu ofício?
Não te plantei,não te colhi,
na superfície,no precipício,
grão debulhado na pradaria,
brotas em flor,faz um jardim.
Chegaste assim,de calmaria,
fora de rota,no chão mais raso,
antes do fim.
A fúria inútil,ajoelhada,
é estrangeira em seu local
e,até sorri da ironia,
sofres também,do mesmo mal?

domingo, 28 de outubro de 2012

APATIA

O dia escoa...
Um ensaio de mudança,
o corpo alcança
mas,a vontade dança,
sem música.
Não vem à tona,
não se aventura.
Será o calor?
Meu dissabor?
Um leve tédio?
Um verme instalado?
Preciso enfiar as mãos na alma.
Sangrá-la,
fazê-la andar,
me levantar.
Seguir com as horas.
Seguir com os dias.
A luz acaba
e,vem a noite
e,mais um dia,
amordaçado.
É só um trem
em movimento.
Sou estação,
mais recuada,
mais recuada,
          ecuada
            cuada
              uada
                 ada
                   da
                     a.

domingo, 14 de outubro de 2012

O SEU,O MEU

Seu amor se veste de acaso,
sai buscando qualquer uma,
dessas,que se encontram em esquinas,
usa,abandona,esquece,
apaga entre brumas.
Seu amor não cria raízes
na possibilidade da perda,
seu amor de vida nenhuma,
amor de bolina.
Meu amor se veste de luz,
une seu dia com a noite,
linha estendida,sem fim sem começo,
lhe cuidando,lhe velando,
quando seu mundo respira entre sombras.
Meu amor,pura emoção,
se afoga,se salva,se enxerga eterno,
fonte infinita,esvaindo
pelo centro,pelas beiras,
no descampado do peito.
Meu amor feito chuva,
amante indecente,sem roupa,
aguando no corpo inteiro,
diluindo seu concreto,
do céu prá terra,completo.
Meu amor puro fogo,
lábios quentes,afagando,
labareda incansável,se alimentando,
bela dança nos lados,no meio,no fundo,
nos nossos abismos,prepara colheita.
Meu amor me dá vida,
feito na minha medida,
ar puro brincando na alma,
entrando e saindo pela boca,
encontrando outras saídas,
sabendo que o coração é porta,
de entrada e de saída.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

"DOCES GUARDADOS"

Há coisas para guardar,
num canto doce da gente,
eu guardei os seus presentes,
quando dar,era tão transparente.
O meu olhar foi mudando,
as coisas se acumulando,
olhava tudo de longe,
de você,me distanciando.
Entrei num grupo de ajuda,
saí de lá com uma idéia,
de jogar tudo lá fora,
depois,escapar,ir embora.
Puz la fora a tv de 29 polegadas,
meus armários,meu sudário,
a geladeira,as peneiras,
as panelas,sua coleção de gravatas,
nossas datas,suas bravatas.
Minha pele de cordeiro,
o seu saco de moeda,
seu champoo anti queda,
sua inquisição,sua falta de atenção,
meus processos de procura,
sua cara dura,
seu risinho debochado,
meus jogos de dama e de dado,
seus remédios,o meu tédio,
sua vitrola,suas bolas,
nosso colchão de mola.
Joguei seu jeito de cientista da Nasa,
que só aumentavam  os buracos da casa.
Poupei minha máquina de costura,
prá remendar minha vida futura.
Poupei meu aquário,meu Veludo,
meu par de pés mais cascudos,
tenho muito que caminhar.
Poupei meus sapos de cerâmica,meu Buda,
meus livros,meu Neruda,
meu disco do Djavan:
"Amanhã outro dia..."

EXPERIÊNCIA AVANÇADA

Você me diz tantas coisas,
em seu silêncio,
coisas que não quero ouvir;
mas,mesmo assim,
eu faço planos.
Fico olhando prá você,
imagino fazer coisas,
uma experiência avançada,
com seu coração,meu coração...
Causar uma mudança.
Eu sonho,eu penso,
fazer um puxadinho,
enfeitado de carinho,
bem longe da tentação.
Talvez,até faça seu doce preferido,
uma torta de limão,
prá lhe prender pela boca,
já que está difícil,pelo coração.
Só quero estar com você,
longe de qualquer lugar,
não ter que disputar sua atenção,
com essas coisas do mundo,
tão donas de você.
Não posso lhe dar
objetos de última geração,
só tenho o meu amor,
que não cabe em caixa de presente.
É amor de imensidão.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

RASTRO DE JAGUAR

Aqui na planície alagada,
o jeito é bem diferente,
o tempo faz emboscadas,
testando a coragem da gente.
Poeira,fumaça na tarde,
reluz o reio no estalo,
o salgado da pele que arde,
tempera um café mais ralo.
O sangue estampa no céu,
vasos,veias e artérias,
mapas de caminhos ao léu,
no espelho da baía,em animada matéria.
Só o homem pantaneiro,
vida toda no cerrado,
tem coração estradeiro,
pulsando no chão amado.
O grito do velho vaqueiro
que leva a vaquejada,
alerta o companheiro,
prá cuidar da bezerrada.
O som distante do berrante,
me lembra a Ave Maria,
rezo por esses gigantes,
na luta por cada dia.
Em volta da bela fogueira,
fome e sede saciadas,
os causos,modas,besteiras,
conversam,com as solidões relaxadas.
Tudo se transforma em magia,
quando a chuva cai de repente.
Raios,trovões,ventania,
inundam a noite quente.
Quem nasceu nesse mundão,
cavalgou sob o sol,ouviu rugidos ao luar.
Quem dormiu sob as estrelas,fez a cama nesse chão,
sabe que aqui deixou seu rastro de jaguar.

ESSA DOR

Minha dor está presa no peito,
nas letras triste de um bolero,
nas rimas de um samba canção,
que no rádio ouço tocar.
Ela toca em meu coração.
Meu olhar perdido em um ponto,
não vê o cigarro queimar,
as pontas dos dedos da mão.
Essa dor cá dentro do peito,
às vezes,senta à mesa de um bar,
me espera em casa,no leito,
está em meu despertar.
Essa dor é só minha,
caminha sózinha,
não vai me deixar.
Faz minha vida boêmia,
me dá noites de insônia,
faz eu ouvir os meus passos,
me assusta em ruas escuras,desertas.
Essa dor cá dentro do peito,
faz poemas imperfeitos,
faz um blues tão sem jeito,
que eu quero cantar,
prá espantar essa dor.
"Trata com cuidado essa dor,
trata com jeitinho,
foi você quem a causou.
Está doendo,amor..."

terça-feira, 9 de outubro de 2012

VENTO

Vento que leva.
Vento de velas,de caravelas,
me leva prá longe.
Vento que encrespa
as ondas do rio,
vento de chuva,
que acaba com a festa,
que faz cachoeira
em velhos beirais,
me leva prá longe.
Encha meu peito,
ele se arrasta vazio,
me faz ser balão,
passear sobre a floresta,
nessa noite de verão.
Vento chicote,
nas ondas do rio,
faz minha canoa
dar salto mortal;
preciso saber
se ainda está vivo
meu coração.
Vento mais manso,
vento que é brisa,
leva até ele,meus pensamentos.
Bata na porta,avisa,
deixei na varanda
minha doce saudade.
Vento amigo,
meu companheiro,
embala meu sono
sobre as ondas do rio,
não deixe que o frio,
venha me despertar.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

MELHOR IDADE

Aprendi a dirigir
muito cedo,muito cedo,
minha idade era ilegal,
eu,de nada tinha medo,
me arriscar,era normal.
Pelas vias de São Paulo,
dirigia um carro velho
que pegava só no tranco,
empurrado por estranhos.
Eu sonhava com um Simca,
com um Simca Chambord.
Namorava escondido,
um brotinho da escola
mas,meu coração ferido,
amava quem não me dava bola.
Não havia internet,
toda livre,esparramada,
só conseguia chegar nos garotos,
com caderno de enquete
e,os bilhetes corriam soltos,
no Correio Elegante.
Ao padre não confessava,
meus pecados mais "medonhos",
a consciência abafava,
os maus pensamentos,nos sonhos.
Brincadeiras de ser gente,
cresciam dentro do jeans desbotado,
enquanto esperava de contrabando,
a Lee branca do Paraguai.
O meu sonho impossível era a Lee,
desejava muito, uma branca Lee.
Os tempos tão inocentes
voavam por baixo da saia godet,
os beijos eram roubados,
punham o sangue prá ferver.
Morava em uma vila comprida,
com o olhar abarcando a cidade,
à noite as luzes acesas,
pareciam  constelação.
Eu não sabia
mas,estava na melhor idade.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

LEIA EM MIM

Olhe bem ´prá mim,me veja,
não sou só carne viva
de um desastroso roteiro
que você,ajudou  escrever,
nu e cru.
Não fique de fora olhando,
como mero espectador.
Aproveite,me aproveite,
sou de extremos,
raio riscando o céu
em uma brincadeira de espadas,
nas caladas madrugadas,
antes de ser temporal.
Estou lhe dizendo algo,
me leia!
Há um corpo de palavras em mim,
querendo lhe dizer...
Há um medo animal
de ser escorraçada,tragada.
Acrobata diante de um cego
com medo de despencar.
Descubra a frase secreta,
siga a seta,
leia nas entrelinhas do corpo,
onde você,displicente, passeia.
Estou quase raiz longe da terra,
com certeza vou secar.
Está tatuado no lado esquerdo do peito,
que me perdoe Gabriel Garcia Marques,
"Te quiero no por quien eres,
sino por quien soy cuando estoy contigo",
é meu jeito de dizer, te amo!

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

LIBERDADE

Liberdade,
é uma roupa de festa,
colada ao corpo,
que uso prá passear,
em qualquer hora,
em qualquer lugar.
Meu corpo,muito maior,
se expreme dentro da roupa
e,atrai aquele olhar.
Eu me obrigo a retirá-la.
É minha melhor roupa de festa
mas,pouco uso
pois,continuo a engordar.
A roupa,guardei no armário,
algum dia hei de usar,
vou lutar prá emagrecer.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

SONHO

Sonhei com você,amor,
sonhei que me beijavas.
Éramos sombras na parede
que se desmanchavam entre cal,
filetes de vida,desaguando negro,
num vazio labirinto.
Indo e vindo do infinito,
indo atrás da aquarela,
da cor mais bela
prá colorir o nosso beijo.
Beijo de vida inteira,
beijo de amor,
saqueado,entregado,
faminto de universo,
de mim,de você.
Nossos contornos sumidos,
esvaídos,engolidos pelo beijo.
Sabíamos que íamos morrer
com o beijo
e,depois, voltar a viver,
depois, encontrar nosso início,
sermos dois em um,amor,
nunca ter lembranças,
nunca envelhecer.

DÚVIDA

Seu coração bate por mim,
ou bate prá sobreviver?
Qual silêncio
prá descobrir a resposta?
O silêncio de hospital?
O silêncio de capela?
Fico esperando
qual resposta me atingirá
como um soco,
aqui do lado de fora.
Esperando
uma única resposta.
Depois,
vou entrar em minha casa,
vou fechar minhas janelas...
Um minuto só,um minuto mais,
vou primeiro me alimentar
de paz prá te encontrar,
se não,também perco o chão,
pois já está perdido,o coração.