sábado, 29 de setembro de 2012

RETALHOS

O cavalo bravo,
solto no campo,
é como sinto meu coração.
Some na curva,
arrasta as horas,pinoteia o dia,
vai para longe do casarão.

A tempestade
traz uma liberdade
que o corpo pede,quer se molhar,
quer diluir toda tristeza que há no olhar.

O sonho bom
traz de bem longe o despertar.
porteira aberta,deixa passar,
o mal me quer na sua voz,
é labareda,queima veloz.

A flor da idade
quer válvula de escape,
quer bichinho prá amestrar,
quer um momento prá desbravar,
acha tudo um tesão,tudo sofre o coração.

O curral de Deus
de onde avisto
é feito de retalhos.
Salinas,baías,ilhas de buritis,
ninhal,capões,canto de bem te vis,
pintadas,cervos,tuiuús,araras,jacarés,
cheias,vazantes,corixos,Mar de Xaraés.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

NOSSO VELHO AMOR

O nosso velho amor
se aquece ao lado do fogão,entre panelas,
se enxerga com lampião,à luz de velas,
divide silêncios que matutam
sobre causos que escutam.

O nosso velho amor
anda à noite descalço,de pijamas,
depois,tranquilo,deita em nossa cama,
esperando a manhã nos acordar
e com coisas simples,poder lidar.

O nosso velho amor
cuida um do outro,o bem amado,
tem um sorriso doce,perdido no passado
que sonda de esguelha,encontrar
no outro,igual olhar.

O nosso velho amor
possui uma luz que rompe o escuro,
é semente de um fruto doce,maduro,
é sua mão procurando a minha
quando o medo de nós se avizinha.

O nosso velho amor
é um tesouro por nós encontrado,
é um suspiro,um caminho,um obrigado!
É o encontro de almas na estrada
prá morar na terra prometida.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

MEU DESABAFO

Hoje estou aqui prá desabafar,
prá reclamar desse cotidiano
de dragões para alimentar,
meu roteiro de todo ano.
Estou sempre subindo degraus,
de uma escada infinita;
dragando areia para as naus
mas no fundo há pedra brita.
Criamos ratos tão nobres
que,não aceitam o porão,
eles nos mantém felizes e pobres,
em filas,esperando o sopão.
Quando o vento uiva como cão,
derrubando nossos telhados,
esse reino não estende a mão,
prá secar nossos molhados.
Fazemos escolhas qual roleta
mas,já perdendo de saída,
de terno está o capeta,
com a honra já puída.
A ciranda,cirandinha,
só na roda não faz a conta,
milhões saem da varinha da fadinha,
para o cofre das cuecas.Que afronta!
Tô sem dinheiro,sem cultura,
sem jardins,sem sombras no meu passeio,
o lixo vai cobrir minha sepultura
e,a saúde está morrendo sem asseio.
Prá que ler na mão a sorte,
se já sei o futuro da boiada?
Muitos serão carne de corte,
outros tantos,terão uma casinha caiada.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

EVA

A inocência de Eva
foi para as ruas,
deu por falta do destino,
preso num cigarro aceso,
que a fumaça levou embora.
Eva plantou na esquina,
sua necessidade de respirar,
se embriagou de paixão,
se exibiu com suas plumas.
Só pensava em voar dalí.
Eva não conheceu nenhum Adão,
pai, irmão, amigo...
Tem por protetor,um cafetão.
Eva juntou garfos e facas,
pôs sua beleza na mesa,
uma ceia quase bíblica
e, se serviu no jantar.
Eva se sente cansada,
entre as molduras de vitrines,
está virando alvo dos inúteis.
Tomates,ovos,atirados ao seu redor,
deixam seu mundo pior.
Quando o dia aparece,
mostra Eva alisando livros,
comprando sapatos,roupas bonitas,
perfumes caros,pentes de ossos,
prá pentear futilidades externas.
Sua cara continua pintada,
precisa chamar atenção,
esconder a cicatriz que faz contorno
em seu olhar,em sua boca,em suas mãos.
Eva está com a validade vencida
e,não aprendeu inglês,nem português,
só a lingua que "ela fez",
perto de um chão de privada.
Foi assim que deu entrada,
na calçada da infâmia.


domingo, 23 de setembro de 2012

LÁ FORA

Minhas noites complicadas,
têm insônia,desalentos,
não dormem,ficam acordadas,
vão passando a passos lentos.
Cada dia chega largo,esparramado,
dono de todo lugar,
o meu mundo fica estranho,pesado,
se encosta onde dá prá descansar.
Já levanto renunciada,
pingando lerda,minha vontade,
minha manhã ludibriada,
não vê que a noite ainda me invade.
Esse tempo de céu baixo,
impede a solidão de ir embora,
com ninguém eu me encaixo,
o que busco está lá fora.
Meu espaço está estreito,
com portões que não se abrem.
Mesa,tv,sofá,meu leito,
arrumadinhos,de nada sabem.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

ONTEM

Ontem,tive um dia de simplicidade
que descansou na rede da varanda,
adormeceu ,ganhou mais um ano de idade
e,enfeitou os cabelos com guirlanda.

Ontem,ganhei da vida algo moço
quando já estava perto de morrer,
minha alma fluiu,em alvoroço,
me encontrou,me encantou,voltou a me ver.

Ontem,aceitei com prazer sua mania,
de me por no colo,me morder a nuca,
depois,enquanto sua boca meu beijo comia,
meu corpo arrepiado,sentia uma febre maluca.

Ontem, você tocou minha paixão,
como se tocasse um violão,
do toque surgiu uma canção.
Eu vou ouví-la à sós,com o coração.

Ontem, você me trouxe dezenove rosas,
cada uma de uma cor diferente,
espalhando-as pela casa,bem formosas,
diziam-me o tamanho do amor que ainda sentes.

Ontem, adormeci mais cedo,
com o vento de tocaia
querendo me contar um segredo:
você me abraça quando minha lucidez desmaia.

SEU DESTINO

Vem me conhecer.
Queira me querer,
eu não sou de marte
e, não sou de morte;
sou seu segundo à parte,
que você pode desperdiçar,
inteiro,à porta da frente,
aguardando seu sinal para entrar.
Enquanto estou aqui fora,
vá juntando suas coisas,
dê um jeito onde você mora,
me dê todos os motivos
mas,seja muito criativo,
para eu querer ficar,
para conseguir me prender,
prá sempre juntinho a você.
Porque,meu bem, eu não consigo,
fazer visita à toa,
nem prá fugir da fria garoa,
que insiste em me molhar;
prá mim essa chuva fina
é apenas uma cortina,
a nos separar .
Não quero mais brincar de esconder.
Enquanto você se esconde,
eu insisto em me mostrar.
Não tenhas medo assim,
foi a chuva que fez um borrão e mim.
Eu sou só um verso repentino,
um sonho antigo em sua memória,
quero me fazer seu destino,
deixa eu escrever nossa história.

domingo, 16 de setembro de 2012

PELE ABERTA

Às vezes,os meninos de minha rua,
botam as horas em fios,
só para vê-las passarem,
assim,bem coloridas,empinadas,
bandeirolas tremulando ao vento.
Fazem sombras deslizantes
em meu quintal,
eu passando,fico a olhar...

Às vezes passo um fio,
no buraco da agulha,
vou remendar a alma rasgada,
que do corpo quer sair.
Faço pontos bem sumidos,
esse corpo ainda dá de usar...

Às vezes, no entardecer,
vejo soltos,vários fios de sangue,
na pele azul do céu, retalhada.
Pele aberta e sangue que não escorre.
Um fio separa o sol do rio,
tá inundado de dourado,vai se afogar.
Meu olhar alucinado,
não poderá o fio salvar.

sábado, 15 de setembro de 2012

HOJE NÃO QUERO FAZER UM POEMA

Hoje não quero fazer um poema,
porque meu coração não me deixará sair ilesa,
só me trará mais um dia de tristeza
quando já há tantos que me entopem as veias
e,vão me matando aos poucos.
Hoje não quero o sol,não quero a chuva,
nem as estrelas no céu.
É noite,estou reclusa,do mundo expulsa,
uma inquilina que não pagou aluguel,
implodida de modo cruel,
cordeiro imolado para o nada existir.
Hoje mataram a minha inocência,
a infância e,o seu correr livre pelas ruas.
Mataram a esperança que me brotava sem aviso.
Hoje,o ódio e a ignorância se juntaram,
fizeram cadeias dementes,
regaram as sementes com sangue.
Hoje perdi a palavra e a substância.
Hoje sou duas mãos vazias em prece
mas não consigo rezar,a oração não me aquece.
Hoje uma bomba explodiu no reinado da dor,
onde sou morador.


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

SÓ OLHAR

Enquanto eu te esperava,
o tempo bateu à porta,
pronta eu não estava.
Enquanto eu te chamava,
as horas já estavam mortas
e,tudo perdeu o sentido.
Minha voz cobria o silêncio,
tapeava uma solidão desconhecida,
que se mudou pro meu quarto.
Lá fora um dia arreganhado,
invadia espaços com sombras.
Feixe de luz entre frestas,
me caçou e me encontrou,
atingiu em cheio a pele,
quando eu me encontrava nua,
vagando dentro de mim;
muito além do corpo,
do contorno de tudo que se fazia ser ,eu.
Você me deixou no escuro
e,eu soube aproveitar;
apurei o meu olhar.
Agora,passeio na noite,
de mãos dadas com meu coração,
palmilho cada emoção,
conheço o seu destino.
Sobrevivo cheia de cuidados,
pois meu caminhar
ainda está fragilizado.
Sabe,amor?
Estou indo em direção ao horizonte,
o passo vai devagar,
talvez encontre uma ponte.
Marquei encontro com o sol,
naquele ponto distante
onde ele se encontra com o rio
antes de adormecer.
O que eu quero?
Só olhar.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

DEDO NO DESTINO

A folha era de manga,
sózinha,não tinha o resto.
Seca,retorcida,cor apagada,
tinha um jeito de queimada.
Não precisava do sol.
Não precisava da chuva,
vinha em direção ao chão,fatal
mas,no meio do caminho,o varal,
a folha se salvou,no varal se agarrou.
Ficou ali pendurada, jeito de trapezista,
domando o vento,equilibrista,
espetáculo que o tempo ajudava mostrar.
Não pus dedo no destino,
apenas a cercava com roupas
que punha pra secar;
com o tempo,a folha o varal,
prá mim ficou invisível,normal,
tinha mais o que fazer.
Julho,mochila nas costas,
me botei no Vale Sagrado,
agosto,quente, atribulado,
me cercava de água e vento
e,esqueci da tal folha.
Setembro me pôs mais sensível,
num dia vi algo incrível,
a folha virou um casulo,
pendurado em fio de seda!
Não pus dedo no destino.
Nem o sol quente impediu
o que saiu pelo ralo,
algo gosmento, sem cor,nada belo,
balançando perigoso no ar.
O assombro não me poupa,
era um inseto mudando de roupa,
em que festa vai dançar?
Sonho impossível,secreto,
a folha de manga escondeu,
não se juntar às iguais,
de ser só adubo no chão,
não quis esse fim banal.
Em sua queda mortal,
entre o chão e o infinito,
encontrou aquele varal
e,aí se agarrou...
O universo conspira,
muda o destino da folha,
sem saber vai ser o ventre,
guardar um tesouro na bolha,
uma sina mais que perfeita,
dar a luz a uma borboleta
e,só depois,feliz, morrer.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

OUTRA VEZ SETEMBRO

Penso que a noite virá,e eu vou ter um sonho bom,
estará prata,menos escuridão.
Encontrarei mais fácil o caminho de volta,
verei a menina que fui e,o que estou agora.
Estou sim,pois,graças a Deus,não me encontro pronta.
Cada segundo o meu jeito de olhar para as coisas,muda,
para melhor,eu acredito.
Não estou pronta,há sempre algo para refazer
e,eu aceito me refazer.
Inacabada,só assim,tenho certeza de que continuo viva.
Nesses dias de setembro,desejo mais do que ser a sombra
que só acompanha um corpo,rasteira,calada.
Nunca alcançará as alturas.
Eu quero viver o me resta, nas alturas.
Sonhar mais,criar mais.
Ter a emoção à flor da pele,
ancorada em uma fina linha que não a delimita,
mas que serve de apoio, prá ela se arriscar mais
em busca do novo e que venha o novo.
Sinto que nesses dias,meu tempo passa mais rápido,
só que,o tempo teve tempo de me dar o presente
enquanto passava,passou,passado!
Que louco isso!
Por isso é tão mais fácil me ver inteira no passado,
sentir de como a lucidez judia da gente,pois,lembra demais...
Nesses dias ela anda falhando,retalhando minhas lembranças,
deixando-as soltas,aos pedaços,guardadinhas num cantinho meu
prá que eu possa juntá-las na memória,num outro setembro.
Setembro me faz ser mais doce comigo,ser mais amiga,me perdoar,
até do desejo de querer ficar mais um pouco aqui,
nesse conturbado mundo,como uma semente alada.
Voando...Planando...Voando muito entre prédios,pessoas,
rios,matas,montanhas,praças...
Poder estar mais perto das estrelas e, só depois pousar
num tapete de flores para me plantar,  nascer flor
e,enfeitar meu outro setembro que virá...

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

ACOLHE MEU CORAÇÃO

Não sinto magia no ar,
sensação que vivi até ontem,
talvez seja obra do acaso,
ou, talvez da solidão,
que a saudade caminhe comigo.
Perambulam todas as lembranças,
num movimento constante,
tonta saio à rua,
quero trocá-las pela noite sem lua,
jamais por outra pessoa.
Enrolada em agasalhos,
caminho tiritando de frio,
atrás de alguma  porta secreta,
deve ter algum  calor;
mas a vizinhança  tem fome
e,come sem qualquer distinção,
e eu, sou o prato do dia.
A curiosidade devora,
todos meus ais,meus porquês,
recheios de minha história.
No céu,que o outono acinzenta,
algumas luzinhas tremulam,
o meu frio já as alcançou.
A dor extrema às vezes se vai,
não morre,só empalidece,
doente de tanta dor que sente...
Caminhando em meio ao frio,
prá gelar a tal saudade,
ainda a ouço baixinho,
entre os sussurros da noite,
"acolhe meu coração,me dê abrigo,
aqui fora está frio".